segunda-feira, 30 de junho de 2008

Adeus, Zona de Conforto Intelectual...


Confesso: esta Unidade Curricular tem-me obrigado a sair da minha “zona de conforto intelectual”, a qual minuciosamente (desgraçadamente?!...) venho tecendo ao longo dos últimos 20 anos.

Com efeito, a minha Licenciatura em História foi assumidamente orientada segundo a perspectiva do estudo das Mentalidades, tendo conseguido optar pelas “cadeiras” dessa área, e todo o meu percurso (enquanto educador/formador, e, nos últimos anos enquanto orientador de estágio pedagógico) foi feito, outra vez confesso, privilegiando a filosofia das coisas, das acções, dos procedimentos, investindo sobretudo na qualidade das relações interpessoais, e não prestando tanta atenção, até por falta de tempo de qualidade, mais do que de vontade (em 18 anos “de serviço”, só em 2 leccionei a menos de 25km de casa…) às questões da investigação (seus paradigmas, sua metodologia, sua prática).
Ora eu sei que tudo o que disse atrás não me desculpabiliza, nem sequer me teria impedido de, à partida, considerar estas temáticas, mas de facto esta foi a Unidade Curricular, no Mestrado em Supervisão Pedagógica, que, como já disse, me obrigou mais a sair do conforto das preferências, dos hábitos, dos “sofás intelectuais” nos quais nos vamos sentando, por opção (menos) ou por desleixo (sobretudo)…
Quando criei este weblog, a ideia, talvez demasiado romântica, passava pela interacção e circulação de ideias/de ideais (a Ágora, na Grécia Antiga, era a praça principal na constituição da pólis, a cidade), e portanto escrevi que pretendia “um espaço livre, público, marcadamente aberto, segundo a lógica clássica de participação” - daí a referência a uma bela cidade, Corinto, na qual já tive o grato prazer de passear, conhecer, cheirar…
Cedo me apercebi, no entanto, da dificuldade dessa desejada interacção, uma vez que os meus amigos, a quem informei do nascimento do novo espaço, não estavam “para aqui virados”, bem como por parte dos meus colegas, tão atarefados quanto eu na frequência deste Curso…
Depreende-se então o falhanço da iniciativa? Não! Passo a considerar:
1. Os Objectivos desta unidade curricular passavam pela familiarização com os procedimentos metodológicos “que norteiam e permitem a realização de uma investigação no campo da Educação”, através do conhecimento dos métodos possíveis, dos instrumentos de recolha e de análise de dados, bem como da reflexão sobre as suas respectivas vantagens e desvantagens, adquirindo sensibilidade para os aspectos éticos e para as competências necessárias para a realização da dissertação de mestrado.
Penso ter, humildemente, começado um espaço, que prometo desenvolver, no qual existem referências criteriosamente seleccionadas a cada um daqueles objectivos, nomeadamente aos paradigmas e métodos de investigação em educação, às etapas fundamentais do processo de investigação, aos modos e técnicas de recolha e análise de dados, bem como à postura ética na actividade investigativa;
2. Ao longo das várias temáticas (o processo de investigação, o processo de recolha de dados, a investigação-acção em Educação, a análise de dados, as questões éticas na investigação educacional), fui procurando, embora, como escrevi, certas tarefas me tenham parecido hercúleas, “dada a minha propensão para evitar “as matemáticas”…, saindo da tal “zona de conforto intelectual”, ir além do que gostava, do que me dava mais prazer estudar, procurar o até aí “horrível”, com o firme propósito de cumprir o ideal olímpico, “mais forte, mais longe, mais alto”;
Identifiquei paradigmas e métodos de investigação em educação, relembrei as etapas fundamentais do processo de investigação, seleccionei informação relevante, conhecendo trabalhos de dissertação de mestrado, trabalhando em equipa ou individualmente, interagindo, não percebendo por vezes, admirando, contemplando e considerando excelentes contributos de colegas, pesquisando, pesquisando, pesquisando…;
3. Os recursos de aprendizagem apresentados pelas Professoras Alda Pereira e Luísa Aires, de grande qualidade, muito actuais e úteis, muito contribuíram para que a possibilidade da investigação esteja agora muito mais nos meus horizontes do que há poucos meses atrás (quem diria?!...);
4. A forma como as Professoras desta Unidade Curricular nos proporcionaram caminhos, muito mais do que certezas, foi para mim fonte de inspiração para a prática pedagógica, sobretudo em idades mais avançadas;
5. E por fim, last but not the least, a Ética, talvez o assunto intelectualmente mais próximo da minha formação de base, que tanto gozo me deu considerar, na medida em que tem de proporcionar a ancoragem a todo o edifício investigativo.
Assim, embora não tão ágora como esperava, nem tão de Corinto como queria, certamente muito longe do “sofá intelectual” no qual estava sentado… portanto, este weblog é para continuar. Prometo!

Breve e sucinto guião das etapas de uma investigação


Embora a nomenclatura das etapas de uma investigação seja algo variada consoante o recurso bibliográfico utilizado, podemos sugerir:
1 - Planeamento
- Formulação do Problema que dá origem ao estudo a realizar;
- Identificação dos objectivos, relevância e limitações;
- Formulação da pergunta inicial: observar o quê?;
- Formulação de questões e das intenções/hipóteses de investigação (resultantes da pergunta de partida), tendo em vista a clarificação do objecto de estudo e que serão a referência para a posterior definição dos rumos da investigação;
- Revisão da literatura sobre o assunto;
- Escolha do modo de abordagem de recolha e análise de dados (Paradigma ou método de Estudo - quantitativo ou qualitativo);
- Realização da calendarização (cronograma para o desenvolvimento das etapas seguintes);
- Elaboração de um plano de investigação, cujo plano poderá ser:
. Título (mesmo que este possa vir a ser alterado);
. Objectivo da investigação: problema de investigação, justificação do estudo, limitações do estudo, questões ou hipóteses de investigação, definição de termos (palavras – chave do estudo a realizar);
. Revisão da literatura;
. Procedimentos: apresentação do plano de investigação, indicação do processo de amostragem (sua justificação), instrumentos de pesquisa a utilizar, actividades a desenvolver (descrição pormenorizada de todas as etapas / fases da investigação), validade (de que forma será levada a cabo a validade interna do estudo), análise de dados, calendarização;
. Referências bibliográficas
* estratégias de recolha de informação que serão orientadas por perguntas e hipóteses, tendo em atenção o inesperado;
* definição do objectivo da pesquisa;
* definição clara da meta ou etapas a alcançar pelo investigador: estudos exploratórios (fazem o reconhecimento de uma determinada realidade); estudos sociográficos ou descritivos; e estudos verificadores de hipóteses causais (partem das hipóteses para a sua verificação);
- Selecção de técnicas de investigação;
- Selecção e/ou construção de instrumentos de pesquisa;
- Identificação e articulação dos recursos necessários à investigação (exequibilidade):
* Apoio financeiro;
* Apoio logístico;
* Apoio documental;
* Orientação científica.
2 - Obtenção de acesso ao campo de estudo
3 – Elaboração das Grelhas de análise de dados
4 - Análise do campo
5 - Recolha de dados
- Observação participativa;
- Entrevista;
- Fotografia;
- Documentos/estatísticas oficiais;
- …
6 - Elaboração das notas de campo
7 - Análise dos dados recolhidos
- Interpretação dos dados tendo como base os estudos teóricos
8 - Elaboração das conclusões
9 – Divulgação dos resultados

(Este breve e sucinto guião das etapas de uma investigação resultou de um trabalho do "Grupo Verde", constituído pelos meus caros amigos e colegas Bruno, Carla, Henriqueta, Odília e eu próprio)

Plano da Unidade Curricular de Investigação Educacional (Mestrado em Supervisão Pedagógica)


1. O processo de investigação
1.1. Os paradigmas na investigação em ciências sociais/os métodos
1.2. As etapas do processo de investigação e a organização do relatório de investigação
2. O processo de recolha de dados
2.1. O questionário
2.2. A entrevista
3. A investigação-acção em Educação
4. Análise e tratamento de dados
4.1. A análise quantitativa
4.2. A análise qualitativa
5. Questões éticas na investigação educacional

A questão da validade


A questão da validade (fidedignidade) da investigação está intimamente ligada com a sua credibilidade, a qual pode ser aferida a partir do ponto de vista da fidelidade interna e externa.
A primeira (fidedignidade interna) relaciona-se com a concordância entre os observadores em relação à descrição dos eventos ou fenómenos. De acordo com Goetz e LeCompte (1994), os investigadores qualitativos utilizam as seguintes estratégias para reduzir as ameaças à validade interna: as descrições com baixa inferência (recolha de dados, que pode envolver a descrição das percepções do sujeito num cenário específico ou a representação das suas conversas), o exame de pares (que pressupõe a colaboração de outros investigadores, através da revisão do documento por especialistas naquela matéria), e os dados registados mecanicamente (gravações sonoras, de vídeo, fotografias, etc, que podem ser considerados, examinados e valorizados ou não por outros peritos.
Já a segunda (fidelidade externa) relaciona-se fundamentalmente com a possibilidade de diferentes investigadores obterem resultados diversos com os mesmos dados acerca do mesmo evento ou fenómeno; ainda de acordo com Goetz e LeCompte (1994), tal deve-se fundamentalmente devido: 1) ao papel do investigador; 2) à escolha dos sujeitos; 3) às situações e condições sociais; 4) à definição e categorização dos dados; e 5) aos métodos de recolha e análise de dados.
1. A fidedignidade interna
Ainda que muitos dos especialistas em pesquisa qualitativa defendam que a evidência da fidedignidade é desnecessária se a validade interna puder ser demonstrada (ou seja, é impossível ter validade interna sem fidedignidade), Merriam (1988), citado por Coutinho (2005) diz que a validade interna está relacionada com a questão de como as descobertas se compatibilizam com a realidade (multidimensional e em constante mudança).
Se bem que nos estudos qualitativos a questão da validade interna não seja tão premente quanto nos quantitativos, é claro que o pesquisador (neste caso usando métodos sobretudo qualitativos) procura estabelecer relações ou explicar os eventos ou fenómenos, logo a validade interna “faz sentido em termos de credibilidade” (Vieira, 1999, citado por Coutinho 2005), tanto mais que os efeitos do observador têm de ter em consideração os contextos específicos, sendo então que, por exemplo a descrição, a honestidade e as relações pessoais construtivas ao longo do tempo irão melhorar a validade interna, ainda que, como avisou Lock (1989), tenhamos de ser cautelosos com os sujeitos que ocasionalmente omitem factos ou não falam a verdade, ou mesmo com o facto de várias pessoas dizerem o mesmo não significar necessariamente que tal seja verdadeiro - a repetição de uma ideia não significa validade (Merriam, 1998) – sendo então necessário que o investigador detecte os dados falsos.
2. A fidedignidade externa
Para Ghiglione & Matalon (1997), citados por Coutinho (2005), a validade externa está fundamentalmente ligada: 1) à constituição das amostras; 2) à sua representatividade, o que nos leva à questão da possibilidade da sua generalização, uma vez que o pequeno número de sujeitos e a falta de amostragem aleatória deveriam inviabilizá-la, o que nem sempre acontece, levando a conclusões precipitadas ou mesmo erróneas.
Ora, segundo Coutinho (2005), há duas formas de generalizar os resultados de um estudo qualitativo: a conceptualização (o investigador está interessado em chegar a novos conceitos que expliquem qualquer aspecto específico) e o desenvolvimento de “hipóteses de trabalho” (o pesquisador consegue avançar uma ou mais hipóteses novas que relacionem conceitos ou factores), mas Peshkin (1993) considera que a validade externa neste tipo de pesquisa pode ser feita pelo “usuário”, ou seja, não é o autor do trabalho que faz a generalização, mas sim o seu leitor (“a generalização feita pelo usuário não é de nenhuma maneira uma medida inferior de validade externa”, Lock, 1989). Já Guba e Lincoln (1994) e Mertens (1992), citados por Coutinho (2000) preferem usar a expressão “transferibilidade” para referir o conceito de generalização ou validade externa dos estudos quantitativos.
Assim, parece-me, humildemente, que, ainda que a presença do investigador deva ser garante de rigor (logo fidedignidade, logo credibilidade e portanto validade), a natureza da interacção entre o pesquisador e os participantes, a respectiva triangulação dos dados e a interpretação das percepções devem estar ancoradas em métodos de investigação (sobretudo qualitativos, predominantemente quantitativos ou mistos) que se baseiem em paradigmas de investigação claramente assumidos.

sábado, 28 de junho de 2008

Tipos de estudos no processo da investigação científica


Podemos considerar três tipos de estudos no processo da investigação científica, correspondendo, ainda que vagamente, aos três maiores propósitos da Ciência:
- o primeiro é descritivo, no qual o investigador considera sobretudo no documento o que está de facto a ocorrer. O estudo pode ser qualitativo (descrições através da palavra) ou quantitativo (descrições em números). O investigador não tem controlo sobre o fenómeno em estudo, antes simplesmente regista o que está a ser observado;
- o segundo é designado de correlacional; aqui, o investigador considera uma variável em relação a uma outra, com o propósito de descobrir possíveis relações entre elas. O objectivo deste tipo de estudo é prever as características de uma variável conhecendo o tipo de uma segunda variável. O investigador é, assim, sobretudo um moderador das variáveis;
- o terceiro é experimental, na medida em que o investigador manipula as características de uma variável, observando a mudança correspondente, caso a haja, na outra variável. O objectivo é determinar se há uma relação causal entre as duas variáveis.

adaptado de http://chiron.valdosta.edu/whuitt/col/intro/research.html

sexta-feira, 27 de junho de 2008

3) A Investigação Colaborativa/Cooperativa


Embora a colaboração/cooperação seja frequentemente considerada como uma condição necessária ao desenvolvimento profissional, aquela, só por si, não o induz automaticamente, ou leva ao desaparecimento do isolamento e de outros aspectos característicos de uma profissão; assim, concordamos que a adopção de uma perspectiva colaborativa não é um processo rápido e pode até, num primeiro momento, provocar desânimo, pois os esforços não serão suficientemente reconhecidos, muitas vezes.
No que diz respeito ao universo educacional, nem todos os agentes (professores, Órgãos de administração, etc.) podem estar suficientemente preparados para actuar em colaboração, sendo então necessário proporcionar as condições e o tempo para trabalhar em equipa.
No entanto, “trabalhar em grupo” não significa necessariamente “trabalhar juntos”, mas a colaboração/cooperação devem significar:
a) compartilhar preocupações docentes com outros professores como colegas;
b) contrastar as tomadas de decisão adoptadas nas tarefas educacionais que sucedem as aulas;
c) ceder parte do poder que, de forma tradicional, está centrado na autoridade do coordenador de um determinado grupo de trabalho;
d) permitir que o próprio grupo, de forma consensual, defina os problemas e projectos, considerando os valores e perspectivas de todos os participantes.
O grupo colaborativo/cooperativo não deve anular as diferenças, as necessidades, os talentos, os comprometimentos e as competências individuais, mas, ao contrário, utilizar essa heterogeneidade para favorecer um processo mais rico dentro do grupo, enfrentando, é certo, numerosas resistências, negações e barreiras que nascem e se desenvolvem no decorrer do trabalho, o que permite a autonomia do professor, a qual, embora muitas vezes vista como um déficit (relacionada com incerteza e medo, atitude defensiva e um mau ponto de partida para o desenvolvimento profissional do professor), é considerada, no entanto, por Hargreaves (1993) de forma tripla e como condição de trabalho:
1. O Individualismo Forçado - pode ser descrito como uma situação que força os professores a trabalhar de maneira autónoma devido a limitações administrativas ou organizacionais. Os professores desejam colaborar, mas não têm tempo ou local para consultar um ao outro;
2. O Individualismo estratégico - ocorre quando os professores, devido à alta pressão colocada sobre eles – pressão externa tais como expectativas dos pais, o número excessivo de alunos nas salas de aula, etc – escolhem conscientemente retirar-se na sua própria sala de aula.
3. O Individualismo Electivo - não tanto baseado em preocupações pragmáticas, mas baseado nas razões intrínsecas que os professores escolhem activamente para trabalhar sozinhos, numa tarefa específica por um período limitado de tempo, o que leva à criatividade, estudo pessoal, reflexão, e elaboração de novas orientações para o desenvolvimento profissional.
Assim, embora normalmente se pense que o trabalho colectivo é sempre favorável para o desenvolvimento profissional dos professores e que a autonomia é obstrutiva, concordamos que Autonomia e Colaboração se complementam, sobretudo quanto à pesquisa - o conceito de professor como investigador da sua própria prática tem sua origem nos trabalhos de Stenhouse (1975), baseado na necessidade de que os professores construam o seu próprio projecto educacional, investigando a sua prática pedagógica. Assim, deve desenvolver-se no docente uma disposição para examinar de forma mais crítica a sua actividade, com a intenção de mudá-la, se for o caso. Da mesma maneira, para Imbernón (1994), a formação do professor pesquisador deve desenvolver-se ligada a um modelo indagador que favoreça a autonomia e o desenvolvimento profissional.
Embora constatemos, dia a dia, que os professores dispõem de cada vez menos tempo para realizar pesquisas, na medida em que tarefas meramente administrativas têm sido sobrevalorizadas pelos sucessivos poderes políticos em relação à preparação científico-pedagógica e consequente leccionação, também é verdade que os professores não possuem uma formação adequada para desenvolver pesquisa, pois a pesquisa ainda é vista como um “assunto para pesquisadores profissionais”.
No entanto, não pode haver prática pedagógica sem reflexão, e na medida em que a prática reflexiva e a pesquisa envolvem conjuntos similares de habilidades, defendemos que um dos melhores caminhos para desenvolver habilidades de reflexão é desenvolver habilidades de pesquisa.

2) A Investigação Participativa


Hall e Kassam (citados por Américo Nunes Peres e Orlando Pereira Freitas, “Proposta de uma nova cidadania para o desenvolvimento social desde o local e o comunitário, UTAD – Pólo de Chaves, s.d.) descrevem a Investigação Participativa como uma actividade que integra e combina a investigação social, o trabalho educativo e a Acção, começando por assinalar que o foco de atenção da Investigação Participativa se situa no trabalho de emancipação de grupos oprimidos ou explorados: os imigrantes, os indígenas, as mulheres, etc.
A Investigação Participativa pode definir-se como um tipo de investigação social crítica, uma vez que integra o conhecimento académico, mas também os valores morais e o conhecimento popular, procurando criar espaços e momentos privilegiados de reflexão e auto-análise, através dos quais os respectivos intervenientes procedam à identificação e ao questionamento dos problemas relativos à realidade em que estão inseridos, que tem sede num contexto que se alimenta das aspirações e das movimentações que os próprios sujeitos participativos desenvolvem, enquanto seres que confiam em si mesmos e se auto-determinam.
Actualmente, a Investigação Participativa é uma estratégia susceptível de contribuir para um conhecimento mais profundo dos problemas das comunidades, bem como para capacitá-las para a sua resolução.
Historicamente ao serviço das classes mais populares e socialmente mais desfavorecidas, a sua utilização como metodologia de análise e intervenção, desde a elaboração da acção-reflexão de Feire (1973, 1988) e da sua teoria da educação e da acção cultural, tem vindo a adaptar-se a outros contextos, na premissa de converter a comunidade no principal agente de mudança/transformação da sua realidade. Para Quintana (1986), este objectivo alcança-se consciencializando a comunidade das suas necessidades e dos factores que as condicionam, dotando-a de capacidades para tomar as decisões adequadas para solucionar os seus problemas e buscando o compromisso da comunidade na acção transformadora da sua realidade.
Esta prática tem como objectivos principais permitir às pessoas um processo de construção ou de consciencialização, o uso da sua experiência, a produção de conhecimento e a sua acção útil para a sociedade. Por outras palavras, tomar consciência, possuir o conhecimento e fazer bom uso dele. A consciência cria algo importante nos homens e nas mulheres: os motivos para a mudança e o desejo de a alcançar.
Atendendo à multiplicidade de perspectivas, processos e etapas, assim como às muito díspares finalidades da acção que assumimos de Participação e sobre Investigação, julgamos que a metodologia a ser seguida deve contemplar quatro fases:
- o Diagnóstico Participativo (que pode ser iniciado por um grupo ou estendido a um sector mais amplo) é operado segundo certas normas estabelecidas de convivência. Nesta fase, devem ser utilizadas as diferentes e adequadas técnicas para a recolha de dados e identificação do(s) problema(s) reais e comuns e das variáveis afectas;
- a Programação e Execução, nas quais são definidas as metas e finalidades e os meios
utilizados para as alcançar. É proposta e executada uma estratégia de acção. Identificados os meios existentes, definem-se e priorizam-se objectivos (qualitativos e/ou quantitativos) alcançáveis e são propostas medidas para reduzir os factores que originam e mantêm o(s) problema(s) e sensibilizar e/ou iniciar a participação da comunidade (de notar que, dada a sua intensidade dinâmica, este processo deve ser bem coordenado);
- a Avaliação, como processo contínuo, desde as primeiras sessões até aos resultados Finais, segue-se para ajuizar os resultados do programa em relação aos objectivos propostos e, se necessário, reformular as hipóteses que foram surgindo no processo reprogramação);
- a Divulgação.
Pelo que considerámos, nesta metodologia participativa, a investigação é considerada como um processo de participação social, no qual é fundamental considerar um equilíbrio mutuamente possível, de autonomia, cooperação e hierarquia com e entre as pessoas, sendo a tomada de decisão partilhada entre todos os parceiros do processo de investigação. É também, um processo de investigação densamente trespassado de significados e valores, em todas as etapas do seu percurso, o que se apresenta como um desafio complexo, na medida em que os significados e os valores que estão aí presentes, poderão ter interpretações diversas (consoante a idade, sexo, ocupação, denominação, etc) dos intervenientes no processo.
A investigação participativa, enquadrada no paradigma participativo de investigação (cf. Denzin e Lincoln, 2000), propõe aos investigadores considerar o processo de investigação como uma realidade participada e partilhada. Num paradigma participativo de investigação, defende-se uma relação participada entre investigador e investigado (Heron, 1996)2, onde o investigado é também um investigador, estabelecendo-se entre os dois uma relação interactiva e aberta à mudança. Metodologicamente, a investigação é considerada como um espaço intersubjectivo, para onde confluem múltiplas formas práticas, conceptuais, imaginárias e empáticas de conhecimento.
No entanto, um princípio a ter em conta na investigação participativa é que nenhum método de investigação é intrinsecamente participativo (Boyden e Ennew, 1997), sendo a natureza da investigação não uma questão de técnicas de recolha ou tratamento de informação, mas algo que se centra na orientação estratégica da pesquisa, isto é, algo que se relaciona com as concepções epistemológicas e políticas e éticas, com implicações técnicas.